top of page

PEREIRA BRASIL

  • Maria Isabel Gomes de Matos
  • 2 de fev. de 2024
  • 5 min de leitura

Atualizado: 11 de out. de 2024


"O livro que eu esperava

Pereira Brasil


Veio, afinal, a mensagem do vate cearense. E veio serena, de mansinho, sem alardes nem reclamos. Deu-lhe o aedo sutil um título que se quadra, à justa, com as belezas de sua alma superior e os primores de sua inteligência fascinante.


Oração dos Humildes! Que outro nome poderíamos esperar para o cadernos de versos de um espírito tocado de piedade e de ternura pelos seus semelhantes obscuros e angustiados? Os engenhos eleitos, como o desse cativante Gomes de Matos, primam sempre pela simplicidade e pelo comedimento. Tudo neles é receio de ostentação. Dão-nos riquezas e maravilhas, mas rotulam-nas com apoucamento, tementes de os inculparmos de jactanciosos.


Foi por isso, e por conhecer a força do talento de seu ator, que tomei de Oração dos Humildes para confabular com o amigo e irmão de sonhos, sabendo, de antemão, que iria ser levado por um punhado de cousas belas, a um mundo de espiritualidade onde seriam esquecidas, por algumas horas, as sensações e realidades desta precária vida terrena. E de que me não enganara, testifica a frase admirativa em que sintetizei minha impressão ao cabo da leitura: 'Esplêndido poeta, esse Gomes de Matos'.


Alguns poderão querer dizer que ele não passa de escritor espontâneo, com irrepreensível aticismo no escrever, pois que, versejando, nem sempre obedece à rima e ao metro. Mas não: é poeta mesmo, tão poeta quanto prosador escorreito. A pena elegante e tersa que escreve no jornal, do artigo de fundo à crônica ligeira sobre as ocorrências do dia, e que destrinça, em seção especializada, as mais sérias questões de filologia, ostenta equipolente refulgência e segurança no meneio do verso.


A poesia não reside apenas na musicalidade das estrofes e na justa medida das frases rimadas. mesmo sem a repetição de sons emparelhados ou alternados num conjunto de palavras obrigadas a um determinado limite de sílabas pode haver boa poesia, porque esta é sentimento, vibração, elevação de espírito, adivinhação das amarguras coletivas, compreensão da natureza, evocação do passado, revelação de estados d'alma, aspiração, criação enfim. E tudo isso ainda no livro de Gomes de Matos, a que não escasseia equilíbrio expressional, eurritmia de pensamento e o encanto das metáforas felizes.


Escrevendo sobre a função da imagem na poesia, o autor de 'Poemas do Vício e da Virtude' diz esposar a opinião de Paulo Souria quando afirma: quand nous disons que la poésie ne s'adresse pas à l'intelligence mais seulement à l'imagination, on comprendra que ce qu'il y a de vraiment poétique dans um poéme, ne sont pas les idées, mais les images. E porque a imagem não é, na poesia moderna, uma simples flor de luxo, proporcionado-nos, ao revés, um sentido mais total e profundo da realidade, no dizer desse mesmo Menotti Del Picchia, 'Oração dos Humildes' cresce em valia aos nossos olhos, pelas lindas alegorias que contém.


No poema inicial do livro, o suave rapsodo alça a sua voz compassiva num canto em que se polarizam os seus altos sentimentos de solidariedade humana ante o desalento e as experimentações dos que vivem num mundo sem grandezas, chamando-os para junto de si: 'Venham todas as vozes humanas, do sofrimento humano e real. Penetrem o meu coração e vibrem nos meus lábios, que eu quero rezar alto a oração dos humildes.'


E entra a orar, mas no cimo de uma montanha tão alta, que o eco de suas preces chega aos ouvidos de todas as criaturas que veem na arte a sublimidade da vida. Suas súplicas são os poemas que formam o conteúdo do livro. Os mais belos e tocantes? A despeito da excelência de todos, respigo entre os que mais me tocaram a sensibilidade: Sarjeta, Para além da montanha, Mosaico Vale de Josafá, Manhã Clara, Puro Espírito, Oração, entre outros."

Artigo publicado no "Correio da Manhã" e republicado no"Lavoura e Comércio"

"(...)

Foi por isso, e por conhecer a força do talento de seu autor, que tomei de 'Oração dos Humildes' para confabular com o amigo e irmão de sonhos, sabendo, de antemão, que iria ser levado por um punhado de cousas belas, a um mundo de espiritualidade onde seriam esquecidas, por algumas horas, as sensações e realidades desta precária vida terrena. E de que me não me enganara, testifica a frase admirativa em que sintetizei minha impressão, ao cabo da leitura:

– Esplêndido poeta, esse Gomes de Matos!"

Trecho de carta de José Pereira Brasil a Santino Gomes de Matos comentando "Oração dos Humildes" – 1940

"(...)

Leve à conta dos meus quefazeres judicantes neste trabalhoso ano de pugnas eleitorais a demora destas letras sobre 'Céu Deposto'. Lendo-o de um só lance, magnetizado pelas rutilâncias do engenho poético, de logo me capacitei de que o festejado versejador de 'Oração dos Humildes' e de 'Procissão de Encontros' veio testificar que, embora esteja nos começos da descida da montanha do plano da experiência humana, seu espírito criador continua a exalar os cimos do Parnaso Nacional. Os anos não lhe diminuíram a força do talento e da imaginação de vate já incluído no elenco dos nossos renomados beletristas.


Não destaco nenhuma das produções de 'Céu Deposto' por ter, para mim que nele você operou o surpreendente milagre de juntar 86 estrelas de equipolentes grandeza e esplendor para que não se lhe pudesse fazer classificação das mais fúlgidas. Não sei o motivo pelo qual tanta mediocridade figura em antologias, e os versos de espírito de eleição, com o seu, nelas são esquecidos. Bem razão assistia ao Latino Coelho, quando escrevia que morrer é a alvorada do poeta, pois que 'enquanto vivos são importunos, são poetas' e só 'quando as invejas não acham corpo onde morder, senão espírito e luz com que cegar, então os banidos de ontem são os benfeitores de hoje e os gigantes de amanhã'.


Deixe cair, meu dileto Santino, outros céus como esse que nos trouxe tão rara deleitação intelectual, e creia que sua poesia não passará, por toda ela traz o timbre das belezas eternas."

Trecho de carta de José Pereira Brasil a Santino Gomes de Matos – 1960

"Caríssimo Gomes de Matos


Que hei-de eu dizer-lhe em resposta à sua linda carta do dia em que recebi o título de "cidadão honorário" dessa Uberaba que ambos nós dois amamos tão de raiz! Confesso-lhe que suas letras me comoveram e honraram tanto que meu primeiro impulso foi correr à sua casa para lhe beijar a mão e estreitá-lo em fraterno abraço por mais esse testemunho de sua velha estimação. (...)


Espero que na minha primeira visita a Uberaba, possa passar com você alguns quartos de hora, na sua biblioteca abençoada, a fim de agradecer-lhe, de viva voz, o bem que me fez, para testificar, como sempre, que sua amizade para comigo em nada dimimuiu com a distância, talqualmente se deu com minha admiração e amizade que lhe voto.

(...)


Espero que esteja aí a produzir seus belos poemas para um novo livro que nos brinde com joias raras como as que nos proporcionou em 'Oração dos Humildes', 'Procissão de Encontros' e 'Céu Deposto', que guardo com especial cuidado entre os volumes de minha predileção, e que tenho relido vezes sem conta, tal o encantamento que me despertam.


Meus respeitos à Yone, a quem Yolanda e Lenita muito se recomendam.

(...)"


Trecho de carta de Pereira Brasil a Santino Gomes e Matos em 4 de outubro de 1968

José Pereira Brasil (Itaituba, 19 de junho de 1889 – São José do Rio Preto, 8 de junho de 1989). Advogado, promotor, magistrado, professor, escritor e também pintor. Além da sua destacada atuação no âmbito do Judiciário, atuou também intensamente na imprensa, tendo sido redator da Gazeta dos Tribunais. Membro da Academia de Letras do Triângulo Mineiro, suas produções poéticas foram em sua maior parte publicadas em periódicos e jornais do Rio de Janeiro e de São Paulo.



bottom of page