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CARLO DE ABREU LOPES

  • Maria Isabel Gomes de Matos
  • 31 de jan. de 2024
  • 5 min de leitura

Atualizado: 11 de out. de 2024


"Ouvi de um político que o 'povo tem memória curta'. Lamentavelmente é assim mesmo. Os fatos, como os homens, são depressa esquecidos. Homens eminentes, tão admirados e queridos, cujas mortes causam grande impacto, podem logo cair no esquecimento.


Seria o caso do Professor Santino Gomes de Matos? Professor excepcional e homem com H maiúsculo. Que sempre foi conhecidíssimo, popularíssimo, procuradíssimo. E poderíamos acrescentar outros íssimos, já agora nas suas qualidades e caráter e de cultura – o que é desnecessário, uma vez que, sobejamente, todos o sabem. E quando digo todos, é porque somam-se em milhares os que tiveram a dita de beber-lhe dos conhecimentos como professor insígne da língua portuguesa. Essa língua difícil e complicada, de que o grande Olavo Bilac traça o perfil: Última flor do Lácio, inculta e bela...


O saudoso e querido mestre sabia ensinar. E ensinava com amor, com entusiasmo que empolgava... e com que autoridade! E dava gosto ver sua inesgotável versatilidade, sua flexibilidade mental, o tempero que punha nas questões suscitadas.


O profundo conhecimento que possuía da língua pátria, de latim e das outras línguas neolatinas, a admiração de seus pares, de linguistas e filólogos nacionalmente conhecidos, e de seus alunos, elegeram-no autoridade inquestionável. E ele, como bom nortista, extrovertido, ciente e consciente de sua cultura, não abdicava de seu pontificado de mestre. Sua cultura era sua cidadela, e nela custodiado, sustentava quantos assédios lhe impusessem.


Tive a grande ventura de privar de sua amizade, e com que saudades me lembro dos momentos em que discutíamos mil assuntos, naquela sua esplêndida e aconchegante biblioteca. E era de se ver e admirar-se a exuberante e multifórmica cultura que transcendia das questões que trazia baila.


Além de filólogo de consumada evidência, constituindo-se em fonte de consulta para estudantes e professores, não somente de Uberaba, que o procuravam diuturnamente (e em que se comprazia), era, por excelência, o diletante que se consumia na perseguição obstinada da sublimação intelectual. Desta estirpe rara e preciosa de espécimens de grandes vultos que vão se extinguindo.


Longe de ser, como nos modernos tempos, um professor tecnocrata, que se especializa em uma única área, o Professor Santino sabia que o ensino da língua implicava incontável série de conhecimentos correlatos. Razão por que, além de se deleitarem seus alunos no aprendizado linguístico, enriqueciam suas mentes, concomitantemente, de profundos conceitos e ciência de outras áreas do saber. Eis por que o vazio imenso deixado pelo grande filólogo e mestre, de nuanças policrômicas, dificilmente será preenchido.


Tenho para mim, e ouso dizer que isto é consenso geral, que um bom mestre é dos maiores benfeitores da comunidade. Porque a instrução, a cultura, o saber que ele calca nas mentes, no espírito, é tesouro que a traça e a ferrugem não destroem e o ladrão não rouba. Ao contrário, ficam para sempre, e seus frutos são perenes.


Santino Gomes de Matos, tal qual um cometa, deixou uma esteira de luz ao longo da estrada da vida que palmilhou. Professor de português, francês, inglês e latim, começou sua trajetória no magistério na cidade do Crato, posteriormente, veio, a convite, para lecionar em Batatais, Orlândia, Ribeirão Preto e, finalmente, transferiu-se para Uberaba, para atuar como professor e jornalista, aqui chegando em 1935, há mais de 45 anos!


Nesta cidade, que adotou como sua, casando-se e criando seus filhos, dedicou-se de corpo e alma ao contínuo labor do magistério, sem prejuízo de outras atividades profissionais exercidas.

Surgiu, então, na constelação dos intelectuais da época, nova estrela, de primeira grandeza, como jornalista que foi o inolvidável mestre. Assim é que foi diretor da Gazeta de Uberaba, posteriormente redator-chefe do Lavoura e Comércio, ao tempo em que se tornava num dos mais cordiais amigos do pontífice dos jornalistas interioranos – o inesquecível Quintiliano Jardim. Simultaneamente, Santino era correspondente do jornal O Estado de São Paulo e colaborador de revistas da Guanabara. No jornalismo, com sua pena fulgurante, ao lado de manter assídua coluna de ensino gramatical, apresentava o festejado intelectual finas produções poéticas, enquanto que, nas devidas oportunidades, sustentava bem alto os interesses de Uberaba, o que pôde melhor fazê-lo, aliás, na miss a de vereador à Câmara Municipal local, como combativo e intransigente defensor da causa pública.


Foi chefe da Agência Municipal de Estatística (IBGE) por mais de 30 anos. Foi Inspetor Escolar do Grupo Escolar Brasil e das escolas municipais de Uberaba. Diretor do antigo Ginásio Brasil, foi o primeiro diretor do Colégio Dr. José Ferreira. Lecionou língua portuguesa, literatura, inglês, francês e latim em diversos colégios locais, sendo professor concursado da antiga Escola Normal Oficial de Uberaba. Ocupava as cátedras de Língua Portuguesa e Filologia Românica da Faculdade Santo Tomás de Aquino, sendo professor permanentemente convidado a ministrar as aulas do curso CADES.


Tantos lauréis lhe valeram a cadeira de membro da Academia Municipalista de Letras de Minas Gerais, de Belo Horizonte, e a cadeira nº 2, como membro da Academia de Letras do Triângulo Mineiro, quando ainda, para tanto, pesaram-lhe as recomendações de cronista consumado, e galardeado contista. E, nestsa difícil área da literatura, foram vários de seus contos premiados em concursos propmovidos em Belo Horizonte, Curitiba e São Palo. Ente eles se destacaram: "Fome" e "as calças do defunto". Deixo as seguintes obras publicadas: Oração dos Humildes, (poesia), Procissão de Encontros (poesia), Céu Deposto (poesia), Por que Maquinaria e Njnca Maquuinário (filologia), "Inferno Divertido da Análise Sintática" (filologia).


Poeta, cronista consumado e galardeado contista, ocupou a Cadeira nº 2 da Academia de Letras do Triângulo Mineiro. Venceu inúmeros concursos de contos e teve grande parte de sua obra publicada, em edições rapidamente esgotadas. Tantos lauréis lhe valeram também a acadeira de membro da Academia Municipalista de Letras de Belo Horizonte.


Casado com a professora Yone Passaglia Gomes de Matos, companheira ideal, de peregrinas virtudes de esposa e mãe, tiveram três filhos. Faleceu o insígne mestre em Uebraba, em 14 dde outubro de 1975.


Eis, em rápidas pinceladas, o perfil do renomado mestre. Muitas páginas deveriam ser escritas para que melhor se pudesse aquilatar o valor espiritual, moral e intelectual daquele homem singular. Daquele que, como na parábola do semeador, lançou a semente do saber, e muitíssimas mentes foram terreno fértil em que medraram e frutificaram.


Nos tempos atuais, os verdadeiros valores vão se diluindo, os heróis substituídos por falsos ídolos. Sejamos justos. Sejamos gratos. Saibamos valorizar os verdadeiros benfeitores. Quarenta e cinco anos consumidos na edução de nossos jovens, dedicados à causa pública em outros setores, enriquecendo nossa cultura – é coisa que jamais poderia ser esquecida. Assim, sugerimos e apelamos para a sociedade uberabense e, em espeical, à colenda Edilidade, e ao ilustre Prefeito municipal para que se dê o nome a uma das praças de Uberaba de Professor Santino Gomes de Matos. Seria uma forma de render ao saudoso mestre e amigo de Uberaba o seu reconhecimento pelo muito que fez por sua gente.

Não será preciso lembrar, todos o sabem que gratidão e justiça é o mínimo que se pode tributar aos que nos fazem bem."

Artigo de Carlo de Abreu Lopes, bibliográfico sobre Santino Gomes de Matos, publicado no jornal "Lavoura e Comércio" em 12 de abril de 1979

Coronel Carlo de Abreu Lopes. Advogado, escritor e memorialista, para conhecê-lo sugerimos a leitura do livro de sua autoria Atos e Fatos de Minha Vida, publicado em 2008, em que discorre magnificamente sobre sua vida de militar e de delegado de polícia em várias cidades e comarcas mineiras.






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