SEM JEITO – Santino Gomes de Matos
- Maria Isabel Gomes de Matos
- 8 de mar. de 2024
- 2 min de leitura
Atualizado: 8 de out. de 2024
Sem jeito é mesmo o meu jeito
de com a vida me compor.
Meu estribilho acaba desfeito
na gama seja qual for.
Não me merecia estes olhos
de gula da vida inteira.
Mas me recuso aos antolhos
que só dão visão festeira
ante o espetáculo bizarro
da humanidade irredenta:
o homem tão preso ao barro
que a alma de si afugenta.
Sem jeito é mesmo o meu jeito
de aceitá-lo d'água e sal,
sem me sentir contrafeito
com o meu clichê astral.
As chaves do meu mistério
recebi-as muito cedo.
Virou graça o que era sério,
e o sério fez-se arremedo.
Sem jeito é mesmo o meu jeito.
Em ridículos me afundo
quando à vida não aceito
o que aceita todo mundo.
O mal campa triunfador
com prevalência de entorno.
E o bem, fanado, em descor,
até nem sei se tem dono.
Os meios de promoção
implicam dinheiro grosso.
E a verdade, sem tostão
fica no fundo do poço.
Se todos lhe prestam preito,
no jogo da hipocrisia,
meu jeito é mesmo sem jeito,
sem jeito minha porfia.
Sem jeito é mesmo o meu jeito,
quando critico e avalio,
pondo o avesso em direito,
e o direito a ouro e fio.
Num mundo sinuoso, torto,
no vácuo põe o mister,
pensa em bonança e porto
a todo humilde escaler.
Lá nos espaços vazios
por onde o homem passou,
da conquista os desvarios
em rastro rubro ficou.
Do morto não é a morte
o que mais na guerra desola.
Mas o órfão entregue à sorte
da piedade e da esmola.
Se é velha a definição,
da velhice não se gasta.
Grandeza? Ou exploração
ao grande a quem se lhe arrasta.
Não convence que se fuja
para a lua, para Marte.
O filhote de coruja
é coruja em toda parte.
O homem leva consigo
aos mundos inviolados
a figura do inimigo
perante outros ousados.
Um bicho de pouca altura
– dois metros já é gigante –
a vaidade incomensura,
faz-se Júpiter Tonante.
Bombas e bombas fabrica,
atômicas, de hidrogênio,
e, em medo, se terrifica
das explosões de seu gênio.
Nas sombras espreita o medo.
Falam alto para vencê-lo.
Mas o trágico segredo
é clamor de alto apelo.
Nas sombras espreita o medo.
Ninguém confia em ninguém.
Ou hoje, ou amanhã cedo,
quando a tragédia nos vem?
Sem jeito é mesmo meu jeito,
quando ao robô não adiro,
e ao homem de bom preceito,
à alta técnica prefiro.
Ó ridículos escravos,
da escravidão de si mesmos!
Entre nós, raios rúbidos, flavos.
mas permanecem a esmo.
Palavras em desperdício,
palavras de inteiro ócio,
catadupas se derramam,
mas mesmo ao maior beócio
de esperanças embalsamam.
Que caminho levará
este meu jeito, não sei.
Vai o céu chover maná,
caso vingue a minha lei.
O pão nosso, que é de todos,
sem lutas de mais ou menos,
e centenas de mil rodos
das almas puxarão o veneno.
Limpos de alma, os empreiteiros
da ambição, do ódio, da guerra,
porão verdes sinaleiros
à passagem em toda a terra.
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