SEMPRE HÁ ESPERANÇA
- Maria Isabel Gomes de Matos
- 20 de out. de 2022
- 4 min de leitura
Atualizado: 28 de set. de 2024
Crônica de Yone Passaglia Gomes de Matos, publicada no jornal Degrau em agosto de 1999.
Estamos chegando ao terceiro milênio num clima verdadeiramente apocalíptico. É como se o país, em convulsão, ameaçasse reduzir a pó as suas criaturas. A sublevação da ordem, desdobrada em crises sucessivas, desestabiliza o controle emocional do indivíduo comum, transformando-o num ser acuado pelo medo, pela insegurança, pela incerteza do amanhã, pelo completo desamparo.
O instinto de conservação alerta-nos sobre a iminência de perigos inesperados. Convivemos com a miséria, a fome, com chacinas, assaltos e sequestros – frutos da impunidade e da complacência de autoridades irresponsáveis.
Vemos, horrorizados e impotentes, alastra-se o mal em suas formas mais cruéis: lares devastados, vidas ceifadas, crianças e velhos desamparados, bebês arrancados dos braços de mães pobres para serem vendidos, mercado de órgãos e execuções em hospitais. E nenhuma providência salvadora.
Falta emprego, falta comida, falta higiene, falta assistência médica e hospitalar, falta segurança nas escolas e nas ruas, falta respeito ao ser humano.
Como compreender, como aceitar que tais calamidades aconteçam na Era do Esplendor da Tecnologia – geradora de riquezas, no apogeu das descobertas científicas que podem deter o curso de doenças, acabar com a mortalidade infantil e prolongar a duração da vida por tempo jamais sonhado?
Esta situação caótica vem gerando o desânimo e o ceticismo. Estamos à beira do desespero e da paranoia coletiva. Atingimos o ponto de saturação. É então que, ao chegar a esse limite, quando parece que tudo está perdido, uma voz, vindo do mais íntimo do nosso ser – aquela voz que antes nos alertava sobre o perigo – agora se faz ouvir encorajando-nos a lutar.
É urgente conservar o dom da vida, nosso e de nossos filhos e netos. É indispensável encontrar caminhos. É inadiável restabelecer a ordem, a dignidade, a justiça. Mas, que fazer? Por onde começar? Antes de mais nada, sosseguemos o coração aflito. Procuremos reaver a harmonia interior. Observemos com calma a confusão reinante. Vejam! No meio do caos, aqui e ali, aparecem pontos luminosos, de onde vozes mais fortes se fazem ouvir. São grupos solidários dispostos a colaborar no restabelecimento da ordem e, corajosamente, a defender os direitos do cidadão, cobrando das autoridades mais eficiência e presteza; grupos que, se não conseguirem ser atendidos, em breve se transformarão em multidões, já não mais reclamando, mas exigindo.
Outros, mais confiantes, lembram que "Deus é brasileiro" e que há jeito para tudo.
Estão certos! Para tudo há jeito desde que haja boa vontade e coragem. Por que não apelar para a criatividade, tão nossa, tão legitimamente nacional? Não será por meio dela que acharemos a solução de nossos problemas?
Quem jamais poderia supor que o lixo, pesadelo de todas as cidades, viria a transformar-se em indústria rentável, capaz de tirar da miséria centenas de pessoas. A reciclagem veio confirmar a assertiva "na natureza nada se perde, tudo se transforma", inclusive pelas mãos habilidosas de
artistas e artesãos.
Caixotes de armazém viram peças de mobília; latas vazias, finos vasos trabalhados; folhas de revista, delicadas cortinas; meias desfiadas ganham a forma de rosas, violetas e amores-perfeitos, que rivalizam com exemplares dos mais belos jardins. Para que usar agrotóxicos, tão nocivos à saúde se os "cravos de defunto", enquanto embelezam os canteiros de hortaliças, afugentam os inseto?
Que dizer então da capacidade de nossos inventores que, todos os anos, lançam novidades destinadas à indústria, à agricultura, ao lar? E a lida dos nossos pesquisadores que contribuem para o enriquecimento da ciência? Pena que a patente vá para a mão de estrangeiros, como é o caso de medicamentos à base de veneno de cobra, anti-hipertensivo poderosíssimo. Acontece o mesmo com outros medicamentos e com perfumes tirados da flora brasileira e manipulado fora do país. Mas nem por isso devemos desanimar.
Não importa que o "país do futuro" esteja neste momento "subemergente". Continua sendo "do futuro" e em breve se reerguerá. Também não devemos sentir-nos constrangidos pela presença indesejável das chamadas "comissões financeiras" que, periodicamente, desembarcam no país e são recebidas com reverência devida a semideuses. São tratados "a vela de Iibra", mas nem por isso deixam de usar a "chibata" de poderosos. Aqui estão para investigar se os economistas estão trabalhando direitinho de forma a que não lhes falte o pagamento não da dívida – mas dos juros da dívida, juros tão famintos que nos levam todo o suor do trabalhador brasileiro, extraído em impostos escorchantes.
Há de se ter cuidado se não quiserem tomar as Cataratas do Iguaçu, a Floresta Amazônica ou a Mata Atlântica. Por que não também até mesmo a constelação do Cruzeiro do Sul?
Não somos responsáveis diretos pela situação. Talvez indiretamente pelo voto eleitoral. Mas conforta-nos saber que se erramos foi em boa-fé e confiança em falsos programas jamais cumpridos. Apesar de tudo, não devemos perder a esperança em dias melhores. Sejamos otimistas!
Aprendi com minha sogra, senhora de grande sabedoria, uma preciosa lição para situações como a que enfrentamos. Dizia ela: "Não se amofine. Pior poderia ser". Como as coisas se apequenam quando vistas através deste prisma. Pensemos "alto", dentro de preceito divino do "amai-vos uns aos outros" para recuperar a esperança e a alegria de viver.
O pessimismo e a tristeza só geram inércia improdutiva. O otimismo, ao contrário, acende a chama do entusiasmo criativo, alavanca de todo progresso. Aliemo-nos pois, nesse sentido, com fé e confiança no porvir para festejar, na esperança renascida, o terceiro milênio.
