SOLILÓQUIO – Santino Gomes de Matos
- Maria Isabel Gomes de Matos
- 10 de jul. de 2022
- 1 min de leitura
Atualizado: 23 de abr.
Sou eu mesmo essa tristeza
que é revolta e que é amor.
Que é andrajo e realeza,
ato falhado e vigor.
Sou eu, sim, noite e fanal,
luz e treva, bem e mal.
A sorte gira e regira,
sobe ao céu, o inferno renta.
A asa de neve se atira
aos horrores da tormenta...
É gaivota, é procelária,
é a vida confusa e vária.
Clarezas puras de anil,
corrompe-as a escuridão.
Brisa ameigante e sutil
bate a marcha de um tufão.
Orquestra de descompassos,
riquezas que são bagaços.
Sou eu, sim, essa tristeza,
que é revolta e que é amor.
Que é andrajo e realeza,
ato falhado e vigor.
Sou eu, sim, noite e fanal,
luz e treva, bem e mal.
Capaz de todo o heroísmo,
resvalo na covardia.
É no céu que agora cismo,
eu que o céu escarnecia.
No espaço de um só minuto,
trajo estrelas, visto luto.
Paladino a arremeter
a prepotência e a maldade,
logo passo a me encolher
com espinha de humildade.
Murcha triste um horizonte
feito noite em minha fronte.
Vale mais que eu pegue a fita
do andor dos cresos na praça.
Ou que more em palafita,
sem gesto, sem cor, sem raça.
De qualquer forma escureço
no meu próprio menospreço.
Sou eu mesmo essa tristeza,
que é revolta e que é amor.
Que é andrajo e realeza,
ato falhado e vigor.
Sou eu, sim, noite e fanal,
luz e treva, bem e mal.
Do livro Céu Deposto
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