
Rejane Borges Piacezzi
. Cirurgiã-dentista, formada pela Uniube, Uberaba (MG)
. Pós-graduada a em ortodontia pela Unicid, São Paulo (SP)
. Atua na odontologia há mais de 40 anos
. Casada com José Carlos Piacezzi (falecido), tem dois filhos e três netos
. Expert em vários tipos de artesanato
. Toca piano e violão
Aquela casa...
Rejane Borges Piacezzi
Era uma casa comum, típica de cidade do interior, para quem passasse por ali e olhasse. Fazia a junção de duas ruas, imponente na estrutura, simples perante as pessoas que ali residiam, tamanha era a grandeza, na cultura e no amor.
Os ventos ainda te sondam, "casa da esquina".
Havia grandes janelas, voltadas para o lado de fora, por toda a volta, uma varanda com muitas samambaias e flores, o sol ali brilhava e aquecia paredes e corações. As paredes continham histórias e qualquer pessoa que ali adentrasse, que tivesse sensibilidade na alma, já podia ouvi-las com cuidado.
Por ter tido a oportunidade de ver tudo isso com meus próprios olhos, sinto-me privilegiada. Um conteúdo de estudos e conhecimentos, baseados em elos de amor, ali residia o Prof. Santino Gomes de Matos e sua família.
Amiga de sua única filha mulher, Maria Isabel, mais parecia uma bonequinha, com os cabelos loirinhos cacheados e os olhos muito azuis, transparentes. Sempre que passava as tardes com ela para estudarmos, eu admirava tudo com muito gosto.
Os olhos curiosos de adolescente, estava sempre a observar. Quando lá chegava, do lado de fora, pelas frestas de uma janela, já perdia o fôlego ao ver a Biblioteca do Professor. Livros diversos, do chão ao teto. Eu gostava muito de ler, já ficava inebriada com tantas possibilidades que havia ali.
Ficava imaginando ele ali sentado em sua mesa, e as inspirações vindo como um sopro, então, nasciam lindos poemas, versos e rimas, concatenados, numa sequência romantizada e leves de se ler.
Eu tinha orgulho de estar ali. De longe lá se ouviam as notas de um piano sonoro, com belíssimas melodias, que provocavam em mim uma euforia interior, e entrava sem fazer barulho, em silêncio, para absorver cada bemol ali tocado.
Era um momento com toque de Deus, divino!
D. Yone, elegante, caminhava pela casa em seus afazeres com uma leveza inigualável, tão fina e educada, também se curvando àquele momento mágico. Permanecia sem fazer barulho, em sintonia com os anjos, reverenciando aquele clima de calmaria e amor. E poetizava também. Escrevia crônicas com o coração, escrevendo lindamente, expondo suas emoções.
Aquela casa, que lá da rua era normal a olhos vistos, tinha conteúdo para serem guardados em um baú de memórias, com seus segredos e os percalços até ali vividos, marcas de um pleno passado.
Se eu passar ali, nos dias de hoje, sei que ficarei ainda emocionada e com um lamento de saudades, lágrimas irão cair. Saudades de toda aquela efervescência da juventude, vivenciando sucesso e glórias, que hoje se fazem história..
Aquela casa, de saber e de amor, usava as inspirações para a redenção de suas próprias emoções. Ali, na Bernardo Guimarães, guardada hoje em minhas lembranças, tudo me inspirava, me impressionava e me estimulava a estudar, a versar, a poetizar!
Um amor para muitas gerações.... É espalhar o que ali brotou e se perpetuou!
"Para a vida toda valer a pena viver
Memórias dessa vida se consentem."