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A CALÇADA DO MEU AVÔ – Santino Gomes de Matos

  • Maria Isabel Gomes de Matos
  • 11 de jul. de 2022
  • 1 min de leitura

Atualizado: 6 de dez. de 2023

Nas noites de bacorejo dos sapos na lagoa,

a calçada do meu avô tinha histórias e coalhada.

"Seu" João, "seu" Policarpo e o moleque Catingueira

escanchado no peitoril do alpendre de tijolo.

E o sapo batendo ferro: tan, tan, tan.

E as gias e as rãs, num coro de algazarra,

em surriada às estrelas,

numa vaia de garotos sapecas.

Meu avô conhecia todos os caminhos do céu.

A hora em que os "Gêmeos" apareciam,

em que o "Cruzeiro" tombava inclinado

e a "Arca de Noé" navegava para o sul,

cheia de fogos maravilhosos.

E quando o meu dedo queria ajudar os olhos do meu avô:

– Não aponte; nascem verrugas.

E eu apontava e as verrugas nasciam,

para serem cortadas a canivete e queimadas no vidro quente do candeeiro.

As "Três Marias", em linha reta, sempre juntinhas,

eram um namoro doce para os meus olhos.

E o vento chicoteando a cajazeira,

onde piavam filhotes mal vestidos de penugens.

"Seu" João, "Seu" Policarpo e o moleque Catingueira

cabeceiam, em cochilos fortes de quebrar nariz.

Vão sonhar com as histórias de estrelas do meu avô,

que tem a ciência dos cabelos brancos

e conhece as veredas todas do Infinito:

"Carreiro de Santiago", "Signo Salomão"...

E os sapos desavindos, numa teima aperreada:

– Foi; não foi. Foi; não foi...


A calçada de meu avô tinha as noites mais belas deste mundo.

Mas ele, há muito que tomou passagem na "Arca de Noé" das estrelas.


Do livro Procissão de Encontros

©2022 – Todos os direitos reservados. Permitida a divulgação, desde que citada a autoria.

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