ANJOS DA GUARDA – Santino Gomes de Matos
- Maria Isabel Gomes de Matos
- 14 de out. de 2023
- 1 min de leitura
Atualizado: 28 de abr.
Enesgada entre dois prédios,
a sombra alonga na calçada
a maciez de um acolhimento refrescante.
O garoto atende à voz impositiva da mãe
e empurra o berço da irmãzinha
guloso do retalho de amenidade,
para fugir ao suplício herodiano do sol,
cáustico, anti-infantil.
Sobre as feições rosas do bebê irrequieto
baixam agora as asas do Anjo da Guarda,
que o acomodam em coxins de preguiça,
com um peso azul de visões do incriado
nas pálpebras languescidas.
A presença do pajem no timão do carrinho,
meramente física, compromete a atenção vigilante.
Embalados por assobio de resignação mal sofrida,
os olhos do garoto estão presos ao futebol do meio da rua
que também joga, em movimentos reflexos dos braços e das pernas.
E o seu Anjo da Guarda não vê outro jeito
senão mandar-lhe um maribondo,
que o acomete de estilete em riste,
fazendo-o voltar a si e a sua tarefa de pajem,
despertado daquela roída mágoa
de não aproveitar a bola
e a algazarra juvenil da manhã.
Anjos da Guarda, sede benditos!
Do livro Procissão de Encontros
©2023– Todos os direitos reservados. Permitida a divulgação, desde que citada a autoria.
