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DESEJOS – Santino Gomes de Matos

  • Maria Isabel Gomes de Matos
  • 11 de out. de 2022
  • 1 min de leitura

Atualizado: 24 de jan. de 2024

Se eu fosse aquela abelha pequenina

que anda de flor em flor,

sorveria de um seio de bonina

alívio à minha dor.


E depois, com o mel do meu cortiço,

entrava as pobres casas,

cujas portas são feitas de caniço,

e onde não ardem brasas.


Num pedaço de chão, escuro e imundo,

uma agonia geme...

Vela um pesar de mãe, mudo e profundo,

junto ao filho que treme.


Se eu fosse aquela abelha pequenina,

havia de lá entrar,

para as gotas de orvalho de bonina,

nos lábios do enferminho lhe deixar.


Às vezes, pela tarde, quero ser

simplesmente um garoto

que aí vai assobiando um bom lazer

no seu trajo tão roto!


E havia de ajudar os companheiros

e dar-lhes meu tostão.

E soletrar das lojas os letreiros

ou repicar bola pelo chão.


E quando – à cabecinha um molho de gravetos -–

por mim passasse essa menina triste,

toda enlutada em seus cabelos pretos

e um olhar doente a quem ninguém resiste,

que prazer em levar o fardo seu,

enquanto desse caça às borboletas,

ou fosse, como os pássaros do céu,

em cochichos, falando às violetas!


E, aos domingos, seria guia de um ceguinho,

a pedir, a pedir, de porta em porta,

e a ver, por ele, as pedras do caminho,

e com ele a cantar, se ao povo exorta.


Se eu pudesse conter dentro do peito

toda a mágoa a que o mundo está sujeito!


Do livro Oração dos Humildes

©2023 – Todos os direitos reservados. Permitida a divulgação, desde que citada a autoria.



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