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LEGIÕES DO SONHO E DA LOUCURA – Santino Gomes de Matos

  • Maria Isabel Gomes de Matos
  • 11 de out. de 2022
  • 2 min de leitura

Atualizado: 28 de nov. de 2023

(Ano da última Grande Guerra)


As últimas vibrações, somos nós, irmãos poetas,

desta Alma que agoniza num crepúsculo do Mundo.

Grandes ou pequenos, pobres ou ricos de inspiração e ternura,

somos nós os últimos olhos voltados

para a vida que gira no carrossel destes tempos delirantes,

que prenunciam os tempos de depois.


Amanhã, tudo acontecerá diferente

e só compreenderemos o avesso das coisas,

o avesso de nós mesmos.


Irmãos poetas, não haverá sequer recantos de sombra,

onde se avelude a flor de uma saudade.

Tudo terá um fulgor de paisagem crua,

de artifício, de técnica de vontades dirigidas,

numa civilização esquematizada em aço.

Nada sobrará da Alma crepuscular deste ocaso de Mundo.


Nunca uma morte foi tão desenganadamente morte,

nunca uma treva foi tão densamente treva,

para gerar em seu seio um dia novo.

Mas a vida que vier da densidão implexa do caos

será uma vida de incoerências,

de absurdos teratológicos.


Nenhuma face se há de reconhecer na demência das caricaturas,

nenhum valor se equilibrará no rodopio dos torvelinhos.

O homem girará em torno de si mesmo,

veloz, mecânico, quase inconsciente,

dentro de órbitas fechadas.

Sem respiro de alma, sem réstia de coração,

na tragédia delirante da matéria que reage em função de si própria

em função da vida arremessada em milhões de bólides violentas.


Irmãos poetas,

somos nós os últimos depositários das paisagens de luar da terra.

Das horas de evasão para o infinito

vingando os astros alagados de imensidade.


A mágica de Aladino dos sonhos

não se há de repetir nunca mais,

nas almas devastadas dos homens de amanhã.

E até mesmo o eco derradeiro do derradeiro

canto de nossa despedida

vibrará como uma nota desafinada,

perdidamente desafinada e inútil,

no ambiente sem acústica

de um mundo acabado para a Beleza, para o Amor e para a Graça.


Irmãos poetas,

grandes ou pequenos, ricos ou pobres de inspiração e ternura,

cantemos, cantemos, cantemos,

levando até o fim,

o destino das legiões do sonho e da loucura!


Do livro Procissão de Encontros

©2023 – Todos os direitos reservados. Permitida a divulgação, desde que citada a autoria.







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