NOITE GORDA – Santino Gomes de Matos
- Maria Isabel Gomes de Matos
- 14 de out. de 2022
- 1 min de leitura
Atualizado: 25 de jan. de 2024
Noite gorda de sombra e de pecado.
Não há céu, há escuro.
Não há homens, há animais.
Nunca senti tanto o peso da treva.
Tenho a sensação de uma arroba sobre o peito,
de desalento, de asfixia, de pesadelo.
Ora, vamos para a claridade das avenidas.
Vamos para as rodas alegres, onde se discute futebol
e Greta Garbo e a guerra do futuro.
Veja como os homens são felizes na desgraça.
Acostumaram-se.
Se há terremoto, melhor para os passos da dança.
Até mesmo a terra ajuda, valsando também.
O minuto dourado tem sabor de confeito.
Dissolve-se depressa, é verdade.
Tem gosto de "venha mais".
Mas, se não vier, pouco importa.
Os homens acendem luzes cá em baixo,
para não ver a noite,
uma noite negríssima, de catarata,
que apaga todos os horizontes numa confusão de caos.
Uma noite que ameaça durar para sempre,
porque sepulta uma civilização.
Os cabarés e os cassinos estão funcionando.
Os teatros e os cinemas repletos.
Os "rendez-vous" gorjeantes
de pombinhos amorosos e assustados.
Os bares e cafés cheios de "farnientes",
de ócios ricos, de preguiças milionárias.
Ninguém repara que a escuridão se faz cada vez mais negra.
Só eu sinto a angústia da treva, da sombra que asfixia com um peso de mortalha,
na noite gorda de escuro e de pecado.
Do livro Vozes Íntimas
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