Yone – A infância, a adolescência, a mudança para Uberaba
- Maria Isabel Gomes de Matos
- 9 de jun. de 2024
- 4 min de leitura
Atualizado: 16 de mar.
Giacinto e Izabel, instalados em Pedreira, ali continuaram por alguns anos. Mais tarde mudaram-se para Serra Negra, cidade a apenas 25 km de distância, expandindo o comércio a que a família se dedicava, sem se afastar muito dos parentes. Formaram uma família italiana, no melhor dos sentidos, cujas tradições se transmitiram gerações afora.
Yone foi a caçula dos 16 filhos dos Izabel e Giacinto e teve uma infância de muito aconchego e carinho. Em decorrência da diferença de idade com seus irmãos mais velhos, que já eram casados quando ela nasceu, Yone era mais nova do que vários sobrinhos. Assim, os sobrinhos, pela equivalência de idade, eram como seus primos, companheiros na convivência familiar, nas brincadeiras infantis. Essa fraterna e próxima amizade, especialmente com os filhos de seu irmão mais velho, Celeste, perdurou solidamente ao longo do tempo.
Apesar da vida conjugal harmônica e perfeita, Izabel e Giacinto não viveram em nenhum “mar de rosas”. Com efeito, a família passou por muitas tempestades, percalços e difíceis perdas.

A infância de Yone foi permeada pelo luto. Ela perdeu, durante sua infância, cinco irmãos. E, quando tinha 11 anos, seu amado pai, Giacinto, faleceu.
A família mantinha o costume católico e italiano da época: as mulheres trajavam luto – exclusivamente roupas pretas, por 6 meses, e posteriormente, nos 6 meses seguintes, branco e preto, apenas. Era a forma cultural de demonstrar o afeto pelos que partiram.
Com tantas perdas familiares na infância, as duas meninas, Adelina e Yone, passaram vários anos de suas vidas enfrentando essa dura realidade, que se expressava inclusive no vestuário. Mas, todas essas dificuldades emocionais não se transformaram em amargura. Pelo contrário. A força espiritual de cada uma, a fé em Deus, o aconchego da família unida, nos momentos felizes e nos de dor, configuraram o suporte que as manteve serenas, resilientes, com permanente confiança no porvir.
Ambas se tornaram moças realistas diante das adversidades, mas ao mesmo tempo idealistas quanto ao futuro.
Quando Giacinto faleceu, a irmã de Izabel, Maria, e seu cunhado, Dante, insistiram com ela
para que se transferisse para Uberaba, a agradável cidade mineira onde confortavelmente residiam com seus filhos, alguns dos quais já casados.
Izabel tinha junto dela as filhas mais novas (Adelina – 14 anos e Yone – 11 anos). Os demais filhos já eram casados e moravam em outras cidades, sendo que um deles morava próximo a Uberaba, em Araguari (MG). Desejava muito transferir sua residência para Uberaba, pois estaria perto dos familiares e as meninas poderiam frequentar excelentes escolas. Izabel, na sua trajetória ítalo-argentino-brasileira, casou-se muito jovem, não tendo oportunidade de estudar, como gostaria, por isso tinha como meta que suas filhas adquirissem ótima formação escolar.
Não obstante, Izabel não queria depender dos parentes, por isso hesitava em abandonar sua casa e principalmente seu comércio, sua fonte de renda. Com efeito, à época, uma viúva continuar a administrar o estabelecimento comercial instalado por seu marido, na pequena cidade em que naquela época moravam, era natural, mas iniciar sozinha uma atividade comercial numa cidade maior seria praticamente impossível. No entanto, quem sabe por ajuda dos anjos, surgiu para Izabel uma oportunidade excelente de digno trabalho, em Uberaba.
O dono da Companhia Telefônica de Uberaba, empresa que se instalava na cidade, precisava urgentemente contratar uma gerente para a empresa. Procurava uma senhora de princípios e bem rígida, para administrar diária e diuturnamente a atividade das telefonistas. Estamos falando da década de 1920. As famílias, para liberarem suas filhas para trabalhar, somente o faziam com a garantia de que o ambiente fosse não apenas saudável, mas conduzido por alguém de extrema rigidez e confiança.
Para os tempos de hoje, pode parecer algo inacreditável como funcionava o sistema telefônico de então. As pessoas tinham seus aparelhos telefônicos. Mas, para falar com alguém, precisavam discar para a telefonista, e esta é quem completava a ligação. Não havia chamadas diretas entre os telefones, essa tecnologia só surgiu muitos anos depois. Então, as telefonistas tinham de ser moças muito sérias e responsáveis, dotadas de fortes princípios éticos, porque elas, afinal, poderiam ouvir as conversas telefônicas de todas as pessoas da cidade.
Izabel era a pessoa certa para o trabalho. Católica fervorosa, ia à primeira missa da manhã, todos os dias. Viúva, guardou luto por toda a vida, externando esse sentimento até pelo vestuário. Embora fosse generosa e compassiva, muito feminina e delicada, com um tom de voz muito doce, Izabel era extremamente severa em princípios, rígida no cumprimento de deveres e na exigência com os demais, pois não condescendia com nada que fugisse aos seus valores e convicções. Por tudo isso é que, possivelmente, foi-lhe oferecida excelente remuneração compensatória pelo trabalho, que ela aceitou, mudando-se para Uberaba com suas filhas, Adelina e Yone. Ali as três passaram a viver com tranquilidade e no aconchego da proximidade dos familiares. Afeiçoaram-se logo à cidade, que adotaram como delas, criando laços permanentes de duradouras amizades.
Para bem avaliar o apreço que conquistaram em Uberaba, ressalte-se a homenagem que Izabel recebeu da cidade. Passando a residir em Uberaba desde a década de 1920, foi homenageada na década de 1960, quando foi eleita "a mãe do ano", uma eleição anual feita pelo leitores do jornal Lavoura e Comércio e pelos ouvintes da rádio PRE-5. Naquela época, tratava-se de acontecimento que movimentava a cidade. Vovó Izabel, carinhosamente assim chamada por vizinhos e parentes, tinha então 89 anos e era muito lúcida. Contava à época com 26 netos, 72 bisnetos e um tataraneto. Faleceu logo depois, em 17 de junho de 1966.